Neoliberalismo, A Ideologia na Raiz de Nossos Problemas
Neoliberalismo, A Ideologia na Raiz de Nossos Problemas
16 Feb
Neoliberalismo, A Ideologia na Raiz de Nossos Problemas
A ideologia que domina nossas vidas não tem nome, para a maioria das pessoas.
Mencione-o numa conversa e você verá que seu interlocutor dar de ombros.
Mesmo que tenha ouvido o termo antes, encontrará dificuldade para defini-lo. Neoliberalismo: você sabe o que é isso?O anonimato é tanto sintoma quanto causa de seu poder.
Desempenhou um papel importante numa notável sequência de crises: o derretimento financeiro o ocultamento de riqueza e poder de que os Panama Papers nos oferecem apenas um vislumbre
a lenta derrocada da saúde e da educação públicas; o ressurgimento da pobreza infantil; a epidemia de solidão o colapso dos ecossistemas; a ascensão de Donald Trump.
Mas respondemos a essas crises como se elas emergissem isoladas, aparentemente inconscientes de que foram todas ou catalisadas ou exacerbadas pela mesma filosofia coerente; uma filosofia que tem – ou tinha – um nome.
Pode haver maior poder do que operar anonimamente?
O neoliberalismo tornou-se tão penetrante que raramente o reconhecemos sequer como ideologia. Parecemos aceitar a proposição de que essa fé utópica e milenar descreve uma força neutra; uma espécie de lei biológica, como a teoria da evolução de Darwin.
Mas essa filosofia surgiu como a tentativa consciente de remodelar a vida humana e mudar o locus do poder.
O neoliberalismo vê a competição como característica definidora das relações humanas.
Ela redefine os cidadãos como consumidores, cujas escolhas democráticas são melhor exercidas ao comprar e vender – um processo que supostamente recompensa o mérito e pune a ineficiência.
Sustenta que o “mercado” assegura benefícios que jamais poderiam ser conseguidos pelo planejamento.Tentativas de limitar a competição são tratadas como hostis à liberdade.
A ideologia afirma que impostos e regulação deveriam ser reduzidos; serviços públicos, privatizados.
A organização do trabalho e a negociação coletiva pelos sindicatos são retratadas como distorções do mercado, que impedem a formação de uma hierarquia natural entre vencedores e perdedores.
A desigualdade é requalificada como virtuosa: um prêmio para a utilidade, ela é geradora de uma riqueza que se espalha de cima para baixo, enriquecendo todo mundo
Os esforços para criar uma sociedade mais igualitária seriam ao mesmo tempo contraproducentes e moralmente corrosivos.
O mercado asseguraria que todo mundo recebe o que merece.Internalizamos e reproduzimos estas crenças. Os ricos se convencem de que adquiriram sua riqueza por mérito, ignorando as vantagens – tais como educação, herança e classe social – que podem ter ajudado a lhes garantir isso.
Os pobres começam a se culpar por seus fracassos, mesmo quando pouco podem fazer para mudar as circunstâncias de suas vidas
.Esqueça o desemprego estrutural: se você não tem trabalho é porque não é empreendedor.
Esqueça os custos impossíveis da moradia: se seu cartão de crédito está no limite, você é imprudente e imprevidente. Esqueça que seus filhos não têm mais uma quadra de esportes na escola: se ficam gordos, é falha sua.
Num mundo governado pela competição, aqueles que ficam para trás passam a ser definidos e a se auto-definir como fracassados.
Entre os resultados, como documenta Paul Verhaeghe no livro What About Me?
estão epidemia de automutilação, distúrbios alimentares, depressão, solidão, ansiedade por desempenho e fobia social. Não surpreende que o Reino Unido, onde a ideologia neoliberal vem sendo aplicada com maior rigor, seja a capital da solidão na Europa.
Agora somos todos neoliberais
O termo neoliberalismo foi cunhado numa reunião de 1938, em Paris. Entre os participantes, havia dois homens que definiriam a ideologia, Ludwig von Mises e Friedrich Hayek.
Ambos exilados da Áustria, eles consideraram a social democracia, caracterizada pelo New Deal de Franklin Roosevelt e o desenvolvimento gradual do Estado de bem-estar social da Grã Bretanha, como manifestações de um coletivismo que ocupava o mesmo espectro do nazismo e do comunismo.
Em The Road to Serfdom (O Caminho da Servidão), publicado em 1944, Hayek argumentava que o planejamento governamental, ao esmagar o individualismo, levaria inexoravelmente ao controle totalitário.
Como o livro Bureaucracy, de Mises, The Road to Serfdom foi amplamente lido. Chamou a atenção de algumas pessoas muito ricas, que viram na filosofia a oportunidade para libertar-se de impostos e regulação.
Quando, em 1947, Hayek fundou a primeira organização que iria espalhar a doutrina do neoliberalismo – a Sociedade Monte Pelèrin , ela foi sustentada financeiramente por milionários e suas fundações.
Com tal apoio, ele começou a criar o que Daniel Stedman Jones descreve, em Masters of the Universe
, como “uma espécie de Internacional Neoliberal”: uma rede global de acadêmicos, homens de negócios, jornalistas e ativistas. Apoiadores ricos do movimento fundaram uma série de think tanks que iriam refinar e promover a ideologia. Entre elas estão o American Enterprise Institute, a Heritage Foundation, o Cato Institute, o Institute of Economic Affairs, o Centre for Policy Studies e o Adam Smith Institute.
Também financiaram departamentos acadêmicos, particularmente nas universidades de Chicago e Virginia.Conforme evoluiu, o neoliberalismo tornou-se mais estridente.
A visão de Hayek de que os governos deveriam regular a competição para prevenir a formação de monopólios deu lugar – entre apóstolos norte-americanos tais como Milton Friedman – à crença de que o poder monopolista poderia ser visto como uma recompensa à eficiência.