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17 Aug
17Aug

Neuralink e as fantasias do capitalismo cibernético

Promessa de cérebro-computador de Elon Musk tem efetividade duvidosa. Mas há um objetivo em sua propaganda eufórica: nutrir na sociedade tecno-utopias que camuflam os dilemas humanos reais, mas atraem vultosos investimentos…

  1. É o que disse Sam Altman para uma plateia em Davos, na Suíça, durante o Fórum Econômico Mundial de 2024.

  2.  O “lá” a que Altman está se referindo é o sonho do Vale do Silício de um mundo em que o poder infinito da computação proporcione o paraíso na Terra. Mas há um problema fundamental que precisa ser superado: o planeta é finito. 

  3. Como CEO da OpenAI e supervisor do ChatGPT, Altman observou que os sistemas de inteligência artificial consomem muito mais energia do que se esperava, e ele teme que, em breve, surjam novos limites para as implementações de IA devido à falta de energia disponível. 

  4. De acordo com Altman, o mundo deve adotar a fissão nuclear e, ao mesmo tempo, investir muito mais em fusão nuclear: a expansão exponencial da IA simplesmente exige isso.

  5.  Atendendo ao chamado do infinito, ele investiu 375 milhões de dólares de sua imensa fortuna na Helion Energy, uma empresa norte-americana privada de fusão da qual ele é o maior investidor de capital de risco.

  6.  Ele até mesmo aproveitou a parceria da OpenAI com a Microsoft, que investiu dinheiro na Helion como parte de um acordo totalmente especulativo para comprar eletricidade, apesar do fato da Helion nunca ter produzido nada.

  7. Esse burburinho sobre a inovação é proeminente nas manchetes de jornais, onde os desenvolvimentos tecnológicos são frequentemente enquadrados como “momentos Oppenheimer” que mudam o jogo.

  8.  Dois exemplos proeminentes incluem o início de testes em humanos para o implante cerebral da Neuralink – uma interface inserida no crânio destinada a conectar a carne viva de um cérebro a uma máquina de computação em rede – e anúncios de experimentos de fusão nuclear que alcançaram “ganhos finais positivos de energia” e, portanto, prometem fornecer energia limpa infinita. 

  9. O fato desses dois assuntos nunca estarem longe das manchetes dos jornais, mesmo quando não há desenvolvimentos significativos, nos diz algo sobre o papel da alta tecnologia em nossa sociedade. 

  10. Não é preciso examinar mais profundamente esses exemplos para ver as camadas de fraude, propaganda egoísta e visões tecnocráticas estreitas. 

  11. A cobertura da “promessa” de energia elétrica infinita a partir da fusão, e de conectividade ilimitada por meio de um cérebro-computador dentro do crânio são boas fantasias, se você quiser desviar os leitores da realidade sombria e violenta em que nos encontramos

  12. .A Neuralink Corporation foi fundada por Elon Musk em 2016 e seguiu um caminho de propaganda e criação de mitos conhecidos de seus outros empreendimentos comerciais. 

  13. De acordo com sua missão declarada, 

  14.  Neuralink criará “uma interface cerebral generalizada para restaurar a autonomia daqueles com necessidades médicas não atendidas hoje e desbloquear o potencial humano amanhã”.

  15.  Com base nisso, Musk promete regularmente poderes semelhantes aos do messias de curar paralisia, cegueira, depressão, insônia e assim por diante. No entanto, nos oito anos de existência da Neuralink, a empresa não apresentou nenhuma evidência de que tenha sequer começado a trabalhar em qualquer uma dessas áreas bastante distintas umas das outras. 

  16. Dê a Musk um microfone e um holofote e essa retórica de curar os doentes rapidamente dá lugar a fantasias de criação de um “dispositivo para a população geral” que permitirá a simbiose com a IA “de modo que o futuro do mundo seja controlado pela vontade combinada das pessoas da Terra”.A Neuralink Corp se baseia em pesquisas que remontam ao final da década de 1960, quando o primeiro experimento bem-sucedido em um macaco com uma máquina inserida em seu cérebro permitiu que ele pegasse alimentos por meio de biofeedback. 

  17. Continuando a busca pelo “cérebro inteligente”, a Neuralink recebeu aprovação para realizar experimentos em humanos, e o recrutamento já começou. Isso ocorre depois de uma série de experimentos violentos e perturbadores com macacos, que resultaram em paralisia, inchaço cerebral, convulsões frenéticas, infecções fúngicas e macacos que ficaram tremendo e chorando de mãos dadas com seus companheiros de cela por dias intermináveis.

  18.  Em todos os casos, o resultado final foi a morte. Apesar desse histórico sombrio, uma oferta pública de ações de meados de 2023 mostra que a Neuralink recebeu 280 milhões de dólares de investidores externos que, supostamente, foram enganados pela propaganda infinita de Musk e estão apostando na criação de um dispositivo que esteja próximo de ser comercializado. 

  19. Os obstáculos técnicos para a criação de uma interface de cérebro-computador minimamente funcional, quanto mais uma que seja comercializável – para não mencionar a ética ou o bem – são imensos, e provavelmente intransponíveis em qualquer futuro previsível materialmente fundamentado.

  20. Da mesma forma, os defensores da fusão nuclear aproveitam um surto momentâneo de energia obtido pela tecnologia – muito abaixo da energia inicial colocada no sistema – e o utilizam para dar um salto para fantasias de que a tecnociência produzirá energia limpa ilimitada.

  21.  Em suas imaginações limitadas, essa tecno-correção aparentemente resolverá todo o problema da relação catastrófica da humanidade com a ecologia do planeta, permitindo que osdemonstrou, no entanto, quase “cada palavra escrita sobre o ‘ganho final positivo de energia’ de uma reação de fusão é uma espécie de ignorância fabricada”, observando que “a única coisa ilimitada e livre sobre a energia de fusão é o hype (euforia, propaganda) que ela gera”.

  22.  Essas implicações têm um longo histórico, com a fusão entrando no cenário mundial por meio de um impressionante ato de fraude: 

  23. Em 1951, o presidente da Argentina, o general Perón, anunciou que seus cientistas haviam produzido um “resultado final positivo” em seus experimentos termonucleares, ultrapassando assim os Estados Unidos e a União Soviética e prometendo fornecer energia infinita e ilimitada que seria “vendida em garrafas de meio litro, como leite”. 

  24. O fato dessa promessa ter se desintegrado rapidamente não impediu a repetição de variações sobre o tema ao longo das décadas.

  25.  No final da Guerra Fria, houve uma grande empolgação com a “fusão a frio”, com dois cientistas alegando ter construído um aparelho que poderia abrir um caminho diferente para a obtenção de reações de fusão, levantando novamente à perspectiva de energia infinita.

  26.  O fato disso também ter sido rapidamente desmascarado como propaganda fraudulenta

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